Colunista do Muitos Somos Raros destaca a importância da comunicação para ampliar o fluxo de informação entre os elos que compõem as doenças raras
Quem nasce com uma doença rara no Brasil vive em meio a um limbo repleto de barreiras intangíveis. As primeiras surgem logo no nascimento, quando a família sequer consegue ter um diagnóstico médico. Logo depois aparecem as dificuldades emergenciais para acessar tratamentos, medicamentos e encontrar especialistas na área.
A existência se torna uma busca no escuro por saúde e qualidade de vida. A procura ainda é mais incessante por informação sobre a própria condição de vida, que passa a ser inconstante e, muitas vezes, entregue ao isolamento e abandono.
Você liga a TV e não encontra programas sobre doenças raras. Abre o jornal e não lê notícias sobre o tema. Você também não acha publicações na área disponíveis para leitura. Na internet, ainda pouco se encontra sobre sites e blogs que tratam do universo raro.
Infelizmente, viver com uma doença rara no Brasil é conviver com informações tão escassas quanto às próprias políticas públicas na área.
Nessas mais de duas décadas em que estou cadeirante, pude ver de muito perto a evolução do cidadão com deficiência na busca por suas garantias. Esse movimento começou tempos atrás quando a própria mídia passou a pautar temas referentes ao universo das deficiências. Podemos afirmar que hoje, palavras como acessibilidade e inclusão já fazem parte da agenda setting dos veículos. E embora ainda tenhamos muito a ser alcançado, vejo que as pessoas com deficiência saíram da invisibilidade a qual foram colocadas por décadas. Com o paciente de doença rara, no entanto, ainda há muito a percorrer neste sentido.
Tudo o que se se refere ao raro é raro. Quebrar essa barreira, ao meu ver, é nosso maior desafio para alavancar políticas públicas aos pacientes. O Portal Muitos Somos Raros vem desempenhando um papel muito positivo neste sentido e nos inspirando a desenvolver ainda mais.
Em minha página em uma rede social, passamos a publicar semanalmente posts que trazem à tona a existência de uma doença rara. A repercussão tem sido ótima. É visível que as pessoas passam a se sentir incluídas. Outras, que sequer tinham um diagnóstico, passam a buscar informação com organizações do Terceiro Setor e grupos da sociedade civil.
Costumo muito dizer que a informação é uma das principais ferramentas para se garantir direitos. Uma população bem informada está muito mais preparada para cobrar seus representantes na política e exigir seus direitos em qualquer esfera.
A Lei Brasileira de Inclusão, que relatei na Câmara, é um exemplo prático do que falo. A construção do texto contou com a participação de centenas de pessoas com e sem deficiência, que puderam contribuir de maneira ativa para o conteúdo do projeto. Esse processo só foi possível graças ao compartilhamento de informações em diversas plataformas de comunicação.
Ainda trabalhamos com uma indicação ao Ministério da Educação para que cursos de medicina incluam em sua grade disciplinar o tema de genética humana com abordagem nas doenças raras. A ideia é que os médicos brasileiros, mesmos os recém-formados, estejam preparados para diagnosticar tais patologias, que em sua maioria são de origem genética.
Não vejo outra forma de trabalhar politicas públicas que não seja pelas demandas que emanam das ruas, da vida das pessoas. Neste sentido, os pacientes com doenças raras precisam e devem ter sua voz escutada na sociedade. E para isso é preciso saber, acima de tudo, que elas existem e vivem entre nós.
Mara Gabrilli, é deputada federal e presidente da Frente Parlamentar Mista de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras. Publicitária e psicóloga, também foi vereadora na Câmara Municipal e Secretária da Pessoa com Deficiência da Prefeitura de São Paulo.