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12 de outubro: os ensinamentos das crianças raras

Muitos Somos Raros traz depoimentos exclusivos de como as mães aprendem com os seus filhos 

Por Vinicius Volpi

No dia 12 de outubro, o Muitos Somos Raros homenageia as crianças raras do Brasil e traz depoimentos inspiradores de mães que revelam como é o dia a dia desafiador de ter um filho com uma enfermidade rara. Da angústia do diagnóstico à incerteza do tratamento contínuo. Conheça o impacto que uma doença rara pode gerar na vida de uma família. De Capetinga (MG), Maria Cláudia de Souza Faleiros, 35 anos, mãe de Natália Maria de Souza Faleiros, 6, portadora  de Mucopolissacaridose (MPS) tipo VI, falou ao Muitos Somos Raros:

 “Ela é uma bênção em nossas vidas. Eu não queria que ela fosse diferente em nada”. (Maria Claudia de Souza Faleiros)

Maria Claudia ao lado da filha Natália, de 6 anos. Crédito da foto: arquivo pessoal

“Ser mãe de um filho com doença rara me deixa de certa forma muito abençoada. Se Deus mandou a Natália, ele achava que seríamos capazes de cuidar bem dela. Ela mudou muito nossa visão em relação à vida e aos valores que tínhamos. Ser mãe de uma menina especial me faz especial também, pois descobri em mim uma força muito grande de lutar. Minha fé se tornou mais firme e inabalável a partir do momento que superamos e lutamos juntos. Costumo dizer que a Natália é especial nos dois sentidos da palavra. Especial porque ela é portadora de uma doença rara e especial porque ela torna os nossos dias mais felizes. Aprendemos muito com ela. Ela é uma criança muito ativa, viva, alegre, espontânea e comunicativa. Isso me deixa muito feliz e orgulhosa, além de confirmar o quanto sou abençoada por Deus ter confiado a mim a missão de cuidar de uma filha rara. Ela é uma bênção em nossas vidas. Eu não queria que ela fosse diferente em nada. Falo sempre isso pra ela. Espero que ela seja sempre muito feliz. Eu cuido dela e tudo que faço são pensando na felicidade, no bem-estar e na qualidade de vida dela. Eu sei que Deus vai me permitir fazer isso.”

Acompanhe o depoimento de Rosana Puga de Moraes Martinez, 57 anos, mãe de Pedro de Moraes Martinez, 29 anos, que tem Distrofia Muscular de Duchenne, moradores de Campo Grande (MS).

 “Na nossa vida, nós não nascemos pai e mãe de uma criança com doença rara. Não vem com manual”. (Rosana Puga de Moraes Martinez)

Pedro de Moraes Martinez aos 10 anos, no Rio de Janeiro (RJ). Crédito: da foto: arquivo pessoal

 “O diagnóstico do Pedro foi fechado aos cinco anos de idade depois de muitos exames e idas a médicos. Passamos por muitos especialistas. Começamos a desconfiar que ele fosse diferente. Por ser a caçula, você sempre compara um filho com o outro. Sempre notava que ele caía muito, era preguiçoso para subir escada e quando ele brincava com os amiguinhos sempre cansava mais rápido. Desconfiamos que tivesse algo diferente. Até que com cinco anos, fechamos o diagnóstico dele em São Paulo. O processo todo, desde a suspeita da doença na época, há 24 anos, se hoje existe pouca informação, naquela época você receber um diagnóstico de doença rara foi algo solitário e assustador. Sentimos isso na época. Você passa por várias fases. A de negação, revolta, até que você chega à escolha. Ou você fica o resto da vida inteira lamentando ou chorando, ou você levanta, sacode a poeira e vai buscar aquilo que tem para se fazer, que foi a escolha que fizemos. Foi uma reviravolta. A primeira coisa que você muda é a questão dos valores. As expectativas também mudam. Eu acho que a mudança de valores é a mais impactante. Ninguém está preparado, na verdade, para receber um diagnóstico de doença rara. Quando a gente escolhe ter um filho, todas as expectativas, você coloca naquela gestação, naquela futura maternidade, uma porção de sonhos e expectativas, mas jamais você espera, em momento nenhum, ter de lidar com um filho com doença rara. Na nossa vida, nós não nascemos pai e mãe de uma criança com doença rara. Não vem com manual. Você aprende isso no dia a dia. A primeira coisa que muda é a escala de valores. Você começa a ver que as coisas que realmente têm valor não são aquelas. Não tem nada a ver com coisas materiais, carreira, expectativa financeira para o futuro, com as coisas que você gostaria de fazer, as viagens, os lugares que você gostaria de conhecer. Os valores mudam totalmente. Você começa a ver a essência daquilo que é importante. Ficam muito mais latentes os valores que têm a ver com sentimentos, família, amor e responsabilidade. Além disso, você começa a ter um valor que eu acho muito importante por força da necessidade de buscar informação, outras experiências e conhecimentos, de você se relacionar com outras pessoas que muitas vezes vivenciam a mesma coisa que você, mas têm uma realidade diferente.

Rosana Puga de Moraes Martinez com o filho Pedro de Moraes Martinez, hoje com 29 anos. Crédito da foto: arquivo pessoal

Na verdade, hoje, o Pedro tem 29 anos e eu posso dizer de todo meu coração que eu aprendi muito mais com meu filho do que ele comigo. A convivência com ele e com a doença rara dele, com as pessoas que conheci nessa caminhada, com os rumos que eu dei para a minha vida a partir do momento que resolvi dividir minhas experiências. Fundei a Associação de Doenças Neuromusculares do Mato Grosso do Sul (ADONE), da qual sou presidente desde 2005. As pessoas que você conhece as histórias, outras doenças raras, outras realidades, a sua vida muda totalmente. De repente aquilo não é só por causa do seu filho. É por causa das doenças raras que se tornam a causa pela qual você dedica sua vida e que você não se imagina mais sem ela. Hoje, eu digo do fundo do coração: é um aprendizado. Muda a vida da gente. É a essência da palavra aprendizado. Você entende mais do que ninguém, de uma forma muito clara,  que a vida é feita de escolhas. Primeiro, enquanto eles são crianças, você faz escolhas por eles. Depois, quando eles se tornam adultos, já que você luta pela vida deles todos os dias, você faz as escolhas junto com eles os ensina a escolherem. Você aprende isso na sua vida. É uma bênção, uma coisa maravilhosa. Hoje, não imagino minha vida sem estar inserida nesse universo das doenças raras. Como todos os seres humanos, tenho muitos defeitos. Com certeza, posso dizer que sou uma pessoa muito melhor depois do meu filho com doença rara”.

De São Paulo (SP), Luana  Ribeiro dos Santos, 35 anos, mãe de Luara Crystal Ribeiro de Moraes, 10, portadora de osteogênese imperfeita, conhecida também como a doença dos ossos de vidro, conta como é o dia a dia ao lado da filha: 

“Eu falo que o amor de mãe é o que se aproxima do amor de Deus por nós. O amor de Deus é o amor de uma mãe de um filho especial. É um amor inigualável” (Luana Ribeiro dos Santos)

Luana Ribeiro dos Santos, 35 anos, mãe de Luara Crystal Ribeiro de Moraes, 10,. Crédito da foto: arquivo pessoal

“Minha filha mudou completamente minha visão de vida. Hoje, não espero para colocar a melhor roupa para sair, para brincar com ela ou com os outros filhos, não deixo nada para depois. Eu vivo muito o hoje. Tento ser intensa e presente no hoje. Mudou muita coisa. A gente fica muito aflita com o futuro e tenta viver intensamente o presente.  É uma emoção, descoberta e um desafio a cada dia ser mãe de uma criança com doença rara. É um quebra-cabeça que parece não ter fim, mas ao mesmo tempo é a sensação mais maravilhosa do mundo. É um abraço sincero, um sorriso sincero, um mundo e uma sensação difíceis de serem explicados. As descobertas são sempre maiores, melhores e mais intensas. Não é fácil ser mãe de um filho com doença rara, mas digo que é a melhor sensação do mundo. Eu falo que o amor de mãe é o que se aproxima do amor de Deus por nós. O amor de Deus é o amor de uma mãe de um filho especial. É um amor inigualável”

 

O Muitos Somos Raros também conversou com Fátima Oliveira Braga, 50 anos, mãe de dois filhos, sendo um deles,  o Lucas Braga Vaz, de 15 anos, portador de Atrofia Muscular Espinhal. Acompanhe o depoimento da mãe, que mora em Fortaleza (CE): 

 

 

 

“Deram um ano de vida. Hoje, sou mãe de um adolescente que fará 16 anos”. (Fátima Oliveira Braga)

“No início tudo é muito difícil. Diagnóstico, profissionais que não conhecem a doença. Uma doença genética degenerativa progressiva e sem cura vem para nos mostrar se somos tão fortes como pensamos. Passados 16 anos, no meu dia a dia com meu filho, confesso que no início tudo sempre foi muito difícil. Após uns três anos, nós começamos a notar, tanto eu quanto ele, que teríamos que acreditar um no outro e na capacidade de se reinventar todos os dias. E foi a partir desse pensamento que as coisas começaram realmente a tomar um rumo e entrar no eixo. Quando o Lucas era pequeno, tudo era muito difícil. Cada sorriso, cada balbucio que ele dava, tudo era motivo de festa. Mas eu sempre acreditando que o meu filho, com certeza, se desenvolveria muito mais. Deram um ano de vida. Hoje, sou mãe de um adolescente que fará 16 anos. Conviver com uma doença genética tão grave, que é a Atrofia Muscular Espinhal tipo I me fez ressurgir, uma mulher muito mais forte do que eu imaginaria ser, uma super mãe. Tenho dois filhos, uma super avó – sou avó da Valentina que fará cinco anos – e me tornei um ser humano muito melhor. Hoje, posso discernir o que é importante na minha vida e dos meus filhos. Comecei a desenvolver um trabalho social a partir da Atrofia Muscular Espinhal e hoje sou presidente da Associação Brasileira de Atrofia Muscular Espinhal (Abrame) há 11 anos e sonhamos juntos. Eu e o Lucas. Sonhamos com dias melhores, novos tratamentos e, quem sabe, com a tão sonhada cura. Ser mãe de um filho com uma doença genética grave nos fazer sermos invencíveis. Uma frase que sempre falo: [viva sem limite porque a doença já limita muito}. E hoje sou uma mulher plena e realizada”.

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